O meu assunto favorito sou eu. É viciante, arrisco a dizer. Gosto de me expor a limites. Gosto de me ver a vencer. Se perco, arraso-me. Portanto, prefiro sempre as vitórias. Não obstante, nunca me recuso um desafio e uma luta. Tenho sede de me ver a crescer nos dias. Nas pessoas. De conseguir sempre um pouco mais de espaço e de tempo.
Reconheço em mim uma apetecência. Queda. Atracção. Por pessoas comprometidas. Ou melhor, reconhecia. Existia uma razão. Duas. A primeira é óbvia as pessoas comprometidas acabam por ser mais interessantes. E aqui, refiro-me aquelas comprometidas com outras pessoas. Ou com elas próprias. Há dos dois tipos. Ambos cativantes. Mas vamos-nos concentrar no primeiro tipo.
A segunda razão, explica-se com a alergia crónica que durante anos mantive sobre as relações. As amarras. O compromisso. A responsabilidade. A lamechiche. A partilha. Rapidamente cheguei à conclusão (devia ter uns 18 anos) que não era, de todo, vida para uma menina como eu. Durante estes últimos anos, estive quase sempre com alguém. A maioria reconduzem-se a entusiasmos. Uns engraçados. Uns enfadanhos. O prazo limite que se me impunha era de um mês. Era tempo suficiente para me enjoar. Ou para se enjoarem de mim. Entre os entusiasmos contam-se alguns com pessoas comprometidas. E aqui inclui-se os meninos, para dar uso aos meus 2% de bissexualidade. Atenção, bissexualidade e não heterossexualidade. Há que tingir a diferença.
O compromisso da outra pessoa era a desculpa ideal. Ser a outra pode ser muito bom. é mais intenso do que ser a amiga colorida. e é menos obrigacional. e mais pecaminoso. Imoral. Tem a sua piada. Chega-se a um ponto em que a nossa consciência corrompe-se. E não se pensa em mais nada. Estamos ali por alguma razão. A minha foi sempre uma. Divertir-me sem amarras. Com alguém que não pudesse sequer exigir o que quer que fosse. O ser infiél. Bem. Esse pode ter várias razões para ter um affair. Eu associo sempre a insegurança e cobardia. Ou talvez também um pouco de falta de consciência. Comer fora de casa pode ter a sua piada. Mas se ajudarmos a fazer o jantar, ficar em casa tem os seus prós. Eu que já me relacionei com diversas pessoas infieis, descrevo-me como alguém completamente contra a infidelidade. Eu não sou infiel. E é por essa razão, que só assumi dois compromissos na minha vida. Relaciona-se com a minha forma de ver as relações. Os sentimentos. A seriedade que me é imputável quando assumo alguém na minha vida. Com a credencial que é alguém para ficar. Para permanecer. E aqui, entram os valores de respeito, de protecção, do cuidar e do Amor sedimentado na paixão. Portanto não, eu não aceito a infidelidade como raiz crescente na minha existência. E muito menos, a deslealdade. Por isso, tantas vezes, me condeno à vivência solitária comigo própria. Não tanto pela segurança que isso traz, ou um chamamento à protecção de mim própria. Não é a solidão que me protege. Ou acautela. Isso sou eu que provoco e concretizo. A solidão aconteceu de forma natural, muito antes de sentir qualquer apelo pela carne ou pela emocionalidade. Hoje permanece pela tão já falada descrência nas pessoas e relações. Pela exigência que os anos me têm trazido. O pouco deixou de me bastar. E o muito que acontece, fica abaixo do que quero para mim. Isto tudo por causa do meu tão escondido romantismo idealista. Se não o tivesse, conseguiria viver melhor em comunidade. em intimidade. os passos seriam mais leves. As pessoas, as escolhidas poderiam não ter tanto peso. E assim sendo, a solidão toma o seu lugar. e eu cada vez gosto mais desse recanto. E talvez então, foi daí que nasceu o vício de mim. O narcisismo com um quê de arrogância.
A apetência por pessoas de outras pessoas e aqui sem qualquer sentido de posse ou propriedade, cessou-se, com todas os seus efeitos e consequências, quando o desejo de ser a principal se protelou na situação fáctica de ser a outra. E como se diz, a outra será sempre a outra. Salvo raras excepções, que existem mas nunca se vislumbram como regra. No meu caso não aconteceu. Embora, existissem sinais (ou melhor, manobras manipuladoras) de que estavamos perante uma história de amantes trocados à nascença. A partir do momento, em que a situação muda. Em que deixa de ser pele, corpo, sexo. E tudo passa a ser povilhado de outros meandros. Uns dias com um cariz mais doce. Outros com um cariz devastador. Esse é o momento em que a situação morreu. E o funeral deveria ser organizado com urgência. Certa altura pensei escrever um livro. Um livro que seria composto por frases clichés entre o ser infiel e a outra. Aqui poderiam-se compilar as seguintes frases:
"Já não sabia o que era ser feliz até te encontrar".
"Tu és a mulher da minha vida. Tu."
"Eu sei que isto é errado mas não consigo fugir."
"O que mais quero é iniciar uma nova vida contigo"
"O meu corpo já só responde ao teu"
"Quero tudo contigo"
"Se te perder, condeno-me a ser infeliz o resto da minha vida"
"Não haverá mais ninguém depois de ti"
"Vamos fugir?"
Estas são as frases típicas dos infieis. E são verdadeiras. São ditas e são ouvidas.
E obviamente, são palavras cobertas de ilusões. Passos calculados para que a outra não desista do sonho de ser a principal.
Sim, é tudo um jogo. E só se safa quem souber as regras. Um dia escrevo um manual. Bastou-me ter perdido o jogo uma vez, para saber todos os caminhos que devem ser evitados. É preciso saber interpretar as jogadas. As palavras. O corpo não. Esse rende-se facilmente. Tudo começa por aí. Pela falta de atenção, pela falta de sexo, pela falta de mimo. Há sempre falta de qualquer coisa. Mas as pessoas não querem falar. Nem dialogar. Nem dar o braço a torcer. Ou assumir um comodismo que tanto tem de rotina como de assombração. Então iniciam uma traição. Porque apesar de tudo começa por ser o caminho mais fácil. E só quando a bomba explode, é que o arrependimento nasce. Ou a negação da traição. Sim, é logo a primeira da lista. E não esquecer, se se nega uma vez nega-se para sempre. Porque os infiéis são sempre as vítimas. Sim, é verdade. São os que sofreram. Sofreram muito. Mesmo no meio de uma foda, de um orgasmo, de um beijo. Sim, sofrem sempre. Mesmo quando compram um perfume à outra que é igual ao delas, tudo para despistar diferentes cheiros quando chegam a casa.
É como digo. Um dia escrevo um manual. Pode ser que ajude alguém. Nem que seja, para que as outras deste país acordem para a vida.
Votem sim, no Partido das outras não reincidentes.
Olé.